• Caetité, pequenina mas ilustre – Por Luzmar Oliveira

    17/04/2014 - 22:52


    CAETITÉ

    Semana Santa em Caetité

    No Domingo de Ramos acompanhávamos a procissão com uma palhinha de coqueiro. Era lindo! Segurávamos com orgulho e carinho, como se levássemos um troféu. E desfilávamos pelas ruas cantando os hinos de louvores.

     

    Na Catedral, a missa das nove era super concorrida. A Missa de Ramos.

     

    Na quinta feira, noite da Última Ceia de Cristo com os apóstolos, havia a cerimônia do “Lava Pés”. Segundo a Bíblia, era costume da época, ao receber uma visita, o anfitrião beijar o convidado e oferecer um servo para lavar-lhe os pés e ungi-los com óleos. E assim o padre fazia naquela missa da véspera da crucificação. Escolhia-se um grupo de homens que teriam seus pés lavados e ungidos com os “Santos Óleos”, tal qual fizera o Cristo na sua última ceia com seus apóstolos.

     

    Na Semana Santa cobriam-se as imagens com um pano roxo. Acredita-se que aquilo significava o luto e que, ao cobrir as imagens, simbolizava-se, assim, a tristeza pelos sofrimentos de Cristo. As mesmas eram descobertas após a ressurreição de Jesus. Mas aquilo realmente dava uma depressão tão grande... e note-se que a mesma se acentuava com a procissão dupla, quando uma levava a imagem de Senhor dos Passos e a outra a de Nossa Senhora das Dores, sendo que a ultima nos passava realmente uma tristeza infinda. Alguém colocava em sua mão direita um lencinho. Da sua face pareciam descer lágrimas. E as duas se encontravam na esquina do Palácio Episcopal onde o Bispo ou o Padre Homero faziam a pregação que, incontestavelmente, me fazia chorar.

     

    Lembro-me ainda da Verônica, aquele personagem bíblico que enxugou o rosto de Jesus com uma toalha na sexta estação da Via Crucis (Via Sacra) e cantava um hino em latim: “O vos omnes qui transitis per viam: attendite et videte si est dolor sicut dolor meus”.  Muitas vezes representada pela minha colega Lídia, ou por Marlene (de Dácio) ou ainda Marlene Vilasboas.

     

    Na sexta feira pela manhã acompanhávamos a “Via Crucis” até um dos Cruzeiros da Cidade. Normalmente íamos para o que fica no morro atrás do IEAT. Mas havia também até a Igrejinha de Bruno Silva, lá nos Montes. Era uma subida íngreme e acidentada. Mas, cheios de fé, os católicos não reclamavam nem do sol, nem da poeira e nem do cansaço.

    À noite, na praça, a encenação do crucificamento de Jesus e a procissão do Senhor Morto. Toda a cidade acompanhava com velas protegidas por armação de madeira forrada com papel seda imitando uma lanterna. E o Corpo de Cristo ficava, depois, exposto na igreja para visitação.

     

    O que mais me espanta é lembrar que, naquela época, os adultos nos obrigavam a beijar os pés das imagens. Tanto os do Senhor dos Passos como a do Senhor Morto... aquilo era uma tortura, um ato de terror! E nos trazia medo, pavor, pesadelos.

     

    E finalmente vinha o Sábado de Aleluia! A Ressureição de Cristo. E as queimas dos Judas Iscariotes. Em vários pontos da cidade havia pessoas que se preparavam para isso e faziam a algazarra com humor e beleza. Construía-se um boneco com roupas velhas, bombas e outros fogos. Antes da queima, havia o famoso “Testamento”. Esse sim era divertido! “E para Fulano de Tal, de canela fina e dura, deixo minha bota furada, e a minha dentadura” e assim por diante. Na Rua 2 de Julho tínhamos nosso próprio Judas feito por Juraci Gomes, filho de Seu Auto e dona Tiana. E a meninada se juntava nas imediações do Jenipapeiro do Seu Frederico para, com gritos e gargalhadas, ver o fim do boneco de trapos.

     

    E por último, vinha o delicioso Domingo de Páscoa. Onde nos alegrávamos com chocolates e doces! Após as limitações alimentícias da Quaresma e o famoso Jejum da Sexta Feira Santa, nada melhor que chocolate e muita fartura! E um bom vinho!

     

    Havia a crença de que não se devia comer carne na Semana Santa, pois a mesma simbolizava o Corpo de Cristo. Algumas pessoas não faziam nada além da comida na Sexta Feira da Paixão: Não varriam casa, não ouviam música, não comiam nada doce e sequer corriam. Tudo era pecado! E ainda faziam visitas aos seus mortos no cemitério. Lembro-me que, na volta, não podíamos descer a ladeira correndo, pois, se o fizéssemos, estaríamos pisando no corpo de Cristo. Que loucura!

     

    Mas essa era a nossa cultura à época. Eram os famosos tabus que nos impunham as religiões herdadas dos europeus. E foi assim por muitos e muitos séculos... até que os tempos modernos perdoaram alguns desses pecados.

     

    Quem viveu naqueles tempos há de se lembrar de mais e mais causos, histórias e eventos. De tudo que fazíamos para acompanhar nossas famílias e amigos que cultuavam crenças e preconceitos, mas também tinham fé na sua religião, nos seus pastores e cumpriam os ritos herdados de outras gerações. Das irmandades que participavam das missas e procissões com suas roupas brancas e fitas azuis ou vermelhas. Outros com capas. Da matraca com seu som ritmado. Dos incensos nos turíbulos de prata. Das cantorias. E do nosso amado Padre Osvaldo Magalhães no comando das procissões.

     

    E o que hoje é lembrança, ontem foi a realidade de uma geração que construiu sua fé baseada no medo do pecado, mas também na certeza de um Salvador que veio nos ensinar o perdão, a fraternidade, o amor incondicional! Que nos deixou um legado de esperança no futuro e a certeza da ressurreição ou reencarnação!

    Luzmar Oliveira

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